Juzo Itami é considerado por muitos o maior diretor artista japonês desde Akira Kurosawa.Um titulo brilhante visto que depois de atuar em filmes diversos ele começou a dirigir aos 50 anos em 1984 com o filme "Ososhiki".
Mas ao analisarmos essa brilhante obra que foi o seu segundo filme,percebe-se o uso de diversas vertentes estilisticas ocidentais em contraste com qualquer rigor oriental contemplativo;realmente sua maestria tecnica de contar uma historia com a camera e manter uma narrativa coesa com o uso diverso das mais variadas ferramentas cinematograficas é o mais proximo de um Kurosawa que o Japão se propos a oferecer.
A influencia de Itami é o cinema,e sua possibilidade de contar uma verdadeira historia com as mais variadas emoções.Se o "Tampopo" é considerado um western-spaghetti por reverenciar diversos recursos estilisticos de Leone ou conter as qualidades narrativas de tal gênero,surge a pergunta:
Da onde vem a origem da influencia?
Se os filmes de Leone eram totalmente tributos italianos ao um genero americano inspirados pelos filmes de samurai de Kurosawa?
"Tampopo" é a prova viva de que as influencias artisticas transcorrem como ondas no inconsciente coletivo.Um filme gastronomico que usa o talharim como mote satirico do diretor em sua visão dos costumes da sociedade japonesa.O talharim e sua mega-popularidade é o cerne da historia central em que Tampopo(a excelente atriz e mulher do diretor Nobuko Miamoto) é dona de um restaurante cujo talharim é feito com total despreparo.
Com a chegada de Goro(Tsutomo Yamazaki,um forasteiro a la Clint que em vez de chegar a cavalo chega num caminhão)e seu ajudante Gun(um jovem Ken Watanabe),sua vida passará por uma transformação evolutiva dentro da arte de se preparar um noodles.Por cuidar de Goro depois dele defender ela numa briga perdida,ele aceita a dificil decisão de ajuda-la a achar a receita perfeita pro seu talharime pro visual de seu restaurante(numa especie de Gordon Ramsay japones),encontrando nessa curiosa jornada diversos personagens pitorescos,ironicos e profundos.
O filme é vendido como uma comédia,mas não é uma comedia de apelo comico-visual,o humor vem do modo sagaz e ironico do diretor em relação aos seus conterraneos(de gangsters da yakuza à mendigos) e ao modo como a comida e seus prazeres podem ser inseridos dentro de uma sociedade.
A introdução do filme ja é por si só criativa,com uma sala de cinema onde um gangster de terno branco começa a conversar com a camera perguntando "O que vocês estão comendo agora?".
De repente as luzes se apagam e a historia de Goro e Tampopo se desenrola na tela grande.
Essa metalinguagem de cinema dentro do cinema e arte dentro da arte continua logo apos os creditos iniciais quando percebemos que a excelente descrição artistica de como se comer e apreciar um prato de talharim por um mestre ao seu aprendiz nada mais é que um livro lido por Gun.
A qualidade do cinema japonês de filmar rituais cotidianos como se fossem eles mesmo uma arte é usada aqui como uma saudavel auto-parodia,como o modo em que os restaurantes levam a serio suas receitas,o seu preparo e o profissionalismo de seus restaurantes.
O alimento na vida social é retratado de forma surreal em diversas vinhetas que intercalam a historia principal.Tais vinhetas fogem do aspecto western da historia de Tampopo e são misturadas com o amalgama estilistico presente na mente de Itami e com o surrealismo perversamente ironico de um Buñuel,só pra fazer uma comparação.Aspectos vistos como uma cronica-social tendo como base a alimentação do homem moderno.
Como uma das principais qualidades do brilhante roteiro,escrito pelo diretor,está tambem o modo como ele intercala essa vinhetas com a vida de outros personagens dando uma sensação de vida corrente,como se tudo tivesse acontecendo ao mesmo tempo, o que é reforçado com a presença constante do trem.
Por exemplo:o subordinado que dá um show de conhecimento culinario num restaurante chique em contraste com o descaso de seus superiores em relação ao cardapio ja é intercalado(com a camera seguindo o maitre)com a outra parte do restaurante onde temos uma aula de etiqueta sobre como sugar um talharim sem fazer barulho;o gangster(do inicio do filme e que reflete o lado erotico-violento-perverso da comida)que faz sua amante atingir o orgasmo com uma gema de ovo seguido de uma cena simbolica envolvendo sangue,ostra e...tesão;o homem com dor de dente que após se livrar da dor e ter a possibilidade de degustar loucamente um sorvete ajuda um moleque com uma placa no pescoço dizendo:"Só como alimentos naturais,mensagem da minha mãe.";a mãe de familia que cozinha sua ultima refeição antes de morrer;todas historias conduzidas com uma maestria original e brilhante.
Se ha uma forma de qualificar o filme de modo geral é:
um grande trabalho artistico,original em seu tema e fruto de um auteur provindo de uma geração que costumava usar uma colcha de retalhos do cinema dos mestres.A emoção que o diretor consegue tirar de um bando de mendigos cantando em homenagem ao seu benfeitor,a homenagem chapliniana na cena em que um desses mendigos entra clandestinamente num restaurante pra fritar um omelete de arroz, a violencia,o amor,o humor, todas as emoções são extraidas por Itami de sua propria historia assim como o os mais diversos termos da linguagem do cinema de verdade.Meu texto é pouco pra aprofundar todos os temas tocados por Itami,mesmo que levemente.
Se reverencia Kurosawa,Leone,Buñuel,Ford(como nas brigas de soco,ou na despedia final do herói) ou até mesmo Kubrick(no modo como posiciona as lampadas em prol de um cenario autentico artisticamente e na trilha sonora) não importa.O que importa é que Juzo Itami é um nome a ser reconhecido e reconhecido pelas novas gerações,e que seu segundo filme é uma das principais obras a surigirem do universo cinematografico nos anos 80.
A cena dos creditos finais resume a origem de tudo o que o filme se propos a relatar a seu modo:a veneração da humanidade pela comida e sua conotação quase que sexual.