A tal Republica de Weimar foi paradoxalmente a que mais fudeu com a Alemanha pós Primeira-Guerra e que queimou os filmes da democracia ineficiente que alimentava o fanatismo nazista.
A prova de que um povo falido,humilhado e destruido perante ao mundo produziu otimos filmes é de que o sofrimento causa dor e a dor é uma das bases da arte.Seja em cenarios neo-goticos associados à uma psicologia inerente à um enredo sombrio como em "Nosferatu" de Murnau e "O Gabinete do Dr. Caligari" de Robert Wiene ou ao retrato realista condenatorio de "A Ultima Gargalhada" (um dos filmes mais importantes da historia do cinema),de novo do mestre Murnau,ou do futuristico "Metropolis" de Fritz Lang.
O cinema representava um povo tão sombrio como seus filmes,e essa ligação filme sombrio/povo zumbi é que assusta até hoje.
Porêm....Pabst e seu "A Caixa de Pandora" é um refresco dentro de sua fatalidade tão real quanto cínica mostrando os humanos despidos de qualquer hipocrisia.É um filme pós-expressionismo ou até melhor dizer,anti-expressionismo pois contraria todas as caracteristicas do primeiro em favor de uma sobriedade,a favor dos fatos.Esse movimento chamado de Nova Objetividade com grande destaque na pintura e na arquitetura conviveu nos anos 20 com o Expressionismo no cinema,mas Pabst no final dos anos 20 com este filme e "Diary of a Lost Girl" criou o que ele chamou de SEU momento Nova Objetividade em contraste com os exuberantes Lang e Murnau.
O cerne do melodrama não esta mais em uma epopéia esquizofrenica ,mas em uma puta e seus amantes e sua queda de uma maneira ao mesmo tempo divertida como o cinismo confere,e triste como todo o grande ciclo vicioso que se depara com o final infeliz pra cada individuo dependente da sorte em meio à paixões desenfreadas.Não importam mais os cenarios estilizados mas o que interessa agora são os movimentos de camera acompanhando os hormonios de Lulu quando ela corre feliz,saltita excitada,sorri inebriada ou bate em todo o mundo.O que importa é o ser humano.
Louise Brooks não resistiu ao cinema falado mas seu corte se chama Lulu até hoje e seu magnetismo foi descoberto por Pabst depois de meses de procura
Eu assisti um unico filme de Louise Brooks antes desse,"Beggars of Life"(1928),que ela fez nos EUA antes de fugir e que ela mostra um talento incrivel atuando como uma garota que se junta com um mendigo numa fuga pela ferrovia depois de matar o abusivo padastro.Mas em "A Caixa de Pandora" ela se supera e vira um mito se agarrando nos braços de homens fortes,se aproveitando de homens fracos e carregando todos num redemoinho que acaba em jogos,assassinato,fuga,prostituição e um encontro com Jack The Ripper.
Ela tem maldade?Não.O que ela tem é uma sexualidade maliciosa e despudorada tão latente (um "it" perverso de Clara Bow)que inevitalmente é usado pra atingir seus objetivos ambiciosos acompanhado de uma personalidade ciumenta,magnética e promiscua.E é sempre a pessoa "adorável" que se transforma em monstro,como se o amor que um homem sente por uma mulher como ela fosse a pior das maldições(vide "Sunrise" do Murnau e "O Anjo Azul" de Sternberg).E essa natureza feminina de inebriação e capacidade de destruição é representada na figura de Pandora da mitologia grega que Deus enviou com uma caixa repleta de vicios pra castigar a humanidade pelo roubo do fogo por Prometeu.
Nesse filme está a prova da consolidação de um mito cinematografico influente e importante num contexto social.Até a Condessa Geschwitz se apaixona por Lulu e possui olhares lesbicos excitantes e quentes o que transforma a sensualidade de uma Gloria Swanson em algo puritano perto da libido de Brooks capaz de atrair e subjugar ambos os sexos.
Pabst usou Louise Brooks para inaugurar uma forma de mostrar o mundo do ponto de vista dos dramas psicosexuais de uma sociedade REAL mas sem esquecer da poética da camera que seria seguido por Renoir,Lubitsch,etc.
Um marco.