A pessoa de Isac Dinesen,escritora do livro no qual o filme é baseado,está fortemente ligada à adaptação de Axel,visto a presença constante de uma narradora e o caráter estritamente literario do roteiro.Axel conduz a historia com a complacencia do preparo ao esturpor final de um Dreyer de "Ordet"(1955),uma das grandes contribuições dinamarquesas para o cinema.A mudança do vilarejo com casas coloridas da Noruega do livro para um cinzento amontoado de tijolos num constante céu nublado da Jutland aumenta o exilo,a solidão e a alienação a qual seus habitantes vivem.
A descrição inicial das irmãs após um plano aberto desse minusculo vilarejo ja fortalece a situação de austeridade moral quando seus nomes são apresentados:Martine(batizada após Martinho Lutero) e Phillipa(batizada após Philip Melanchton).
Aquela comunidade aparentemene soturna é embalada pela esperança da fé em reuniões tristes compostas por gente velha e feia.
De repente a aparencia selvagem de Setephane Audran e sua Babette(escolha sugerida por Chabrol,seu ex-marido).
A sua origem em meio a um ecossistema tão estranho é explicada por um brilhante flashback que mostra as duas irmãs no auge da beleza dinamarquesa onde eram adoradas por jovens,e o destino que elas tiveram na vida de um general e um cantor de ópera.
A presença constante do pai ,tido como um lider daquela sociedade,reprime qualquer possibilidade de relacionamento e é claro que elas querem sexo.
Um jovem soldado sueco foge do estilo de vida levado por elas mas nunca esquece de Martine.
Nota-se o lado imparcial e levemente ironico que Axel filma os diversos personagens estereotipados,do pai pastor às exageradas continencias do soldado,ironia que traz ao filme um grande toque comico até a libertação final.
Mas a aparição mais fulgurante artisticamente é de um tenor que se enamora da voz de Philippa na igreja e pede a seu pai que lhe conceda dar-lhe lições de canto.Essas lições representam o tronco estutural de um dos temas abordados,a arte;alêm da vida e da religião.As aulas de canto são cenas de um sublime apuro artistico,o que releva condição do cinema sueco e dinamarques como obras absolutamente sensitivas.Nós entendemos a paixão do tenor e do soldado,as garotas dinamarquesas são lindas;e assim como entendemos a paixão acabamos por entender a repressão sexual e religiosa na qual elas vivem sem perceber.
Ambos o tenor e o soldado vão ter as suas vidas e 35 anos depois,após a morte de seu pai(que se tornou praticamente o messias daquela sociedade)elas recebem em casa Babette,fugida da França,a pedido do tambem envelhecido tenor.
Babette se mostra servil por 14 anos até o principal mote do filme acontecer:Babette ganhar 10.000 francos na loteria.
Martina e Philipa se tornaram herdeiras de seu pai no comando religioso da comunidade,ambas com atitudes quase iguais as de um anjo.
Só o fato de Babette ser uma mulher fugida da França,cujo marido e filho foram assassinados,ja demonstra não ser ela uma pessoa qualquer.O deslumbre final fica por conta de um banquete de despedida oferecido por Babette antes de ela retornar a França após ter ganho o prêmio.Depos de desembarcar codornas,tartarugas e uma poção de especiarias e bebidas caras pra deslumbre dos austeros moradores serventes da humildade daquele minusculo vilarejo,o assombro toma conta das irmãs que profetizam o ato final e diabolico de uma pessoa que veio não se sabe porque ou daonde.
Se todo o retrato da fé e religião é visto como opressor e anti artistico,a surpresa da descoberta de quem é Babette se mostra na tão falada festa dada aos discipulos do falecido pastor na data de seu aniversario de morte.E é deslumbrante ver todos aqueles velhos irritadiços que apena mencionam a Biblia descobrir a cada minuto da festa o quanto a verdadeira libertação se encontra na paixão,no amor e na boa comida.
A cena do banquete é uma aula de interpretação e simbolismo.Com a presença do soldado agora coronel,antigo amor de Martine e suas observações auspiciosas e experientes sobre codornas no sarcofago e uma cozinheira magica do Cafe Anglais.Depois do café com licor,o beijo na boca e o excelente céu estrelado em contraste com os telhados pitorescos se reunem em prol da celebração da vida como ela dever ser,com o fogo do vinho fazendo antigos conhecidos cantarem de mãos dadas em volta do poço.
Um dos mais belos filmes dinamarqueses desde Dreyer(vejam o modo como Axel nos traduz a fé nos olhos de uma discipula procurando Deus no firmamento),"A Festa de Babette" traz no final uma daquelas epifanias otimistas que poucas obras conseguem trazer.
Mesmo que a realidade daquelas pessoas sejam diferente das nossas,sabemos que temas como fé,arte e vida são universais.A grande mensagem é,não se deixe levar pela alienação hipocrita,o grande viver está no viver sem medo,muito menos medo de Deus.O verdadeiro amor é que salva.
Eu não sei se acredito em Deus,mas acredito no cinema dinamarques.
Nenhum comentário:
Postar um comentário