segunda-feira, 3 de setembro de 2012

"Bonequinha de Luxo"(1961) - Blake Edwards



"Bonequinha de Luxo" é originário de um romance sofisticadíssimo revestido de uma crônica social típica do jornalista Truman Capote,que coloca um alter-ego seu(solteiro e bissexual) como mais um dos deslumbrados por uma prostituta de luxo chamada Holly Golightly e sua despudorada honestidade comportamental e interesseira,num eterno jogo de festas e relacionamentos sexuais e financeiros.Diálogos envolventes e uma libertação adequada à época,o romance se tornou um dos maiores exemplos da literatura de Capote na Nova York do final dos anos 50.

Enquanto o livro,se lido hoje,ainda é envolvente e interessante,o filme resbala em anacronismos devido à incapacidade do próprio diretor de se desligar da comédia escrachada.Por sua vez,o otimismo capitalista do cinema americano da época acaba quase que glorificando o que há de mais ilusório na sociedade consumista em que a ambição pela aparência sobrepuja a importância da dignidade e exalta o materialismo que Capote usou apenas para caracterizar um complexo personagem e o ecossistema à sua volta.
É quando o filme se volta para a psicologia de Holly e nos personagens que a idolatram que ele acerta,fazendo com que nos momentos de euforia contrabalanceados pelo sofrimento de segredos revelados com pessoas do passado ressurgindo,a atuação de Audrey Hepburn não permaneça na verborragia teatral e se torne mais humana...mais intensa.
Assim como toda a abrangência sexual que a mentalidade sócio-cultural de 1961 estava começando a tomar exija que o filme se utilize da suposta imoralidade da vida do personagem para defender uma visão feminista,não da mulher "independente" dos anos 40 em busca do casamento perfeito ou das putas sujas de Fellini e Pasolini,mas da puta de luxo de Nova York criada por um dândi intelectual.E é essa posição de ícone da liberdade do esclarecimento feminino o que a personagem de Audrey tem de melhor e deve tomar para si no mundo da cultura-pop acima de qualquer armadilha da superficialidade de Ray-Bans,cigarrilhas compridas e diamantes da Tiffany's.
Tomar café na frente de vitrines da Tiffany's não é uma virtude de Holly,mas a obsessão que a afunda na solidão de alguém que de tanto temer ser enjaulada acabou criando uma jaula para si mesmo.Sendo amada como a "pilantra" que é,não conseguindo se desvencilhar das festas embriagadas,orgias esfumaçadas,acompanhadas pelo jazz de Mancini e a direção bossa-nova-cool de Edwards.Por mais que se atropele em diálogos rápidos demais na tentativa de sintetizar o poder da verborragia do livro numa pressa que despreza a influencia de personagens importantes na vida de Holly enquanto exalta figuras desnecessárias e deslocadas(como o japonês de Mickey Rooney),"Bonequinha de Luxo" ainda é a triste história de alguém que procura eternamente a felicidade e não a encontra.
O roteiro sugere uma redenção naquele beijo da chuva,mas eu garanto que a Holly do Capote volta pro táxi e vira lenda.

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