"Os Sete Samurais" talvez tenha sido a maior carta de amor de Kurosawa ao cinema ocidental e aos westerns de Ford,ao mesmo tempo que influenciou toda uma geração de contadores de história envolvendo companheirismo em decisões de enfrentamento,no cinema moderno.É influente,enfim, como todos seus filmes feitos após "Rashomon",e Kurosawa usa um enredo rico de acontecimentos envolvendo múltiplas personalidades criando uma história de heroísmo e amizade,sendo ao mesmo tempo que romântico e aventuresco...lírico em seus enquadramentos cuidadosos.
O filme começa mostrando plantadores de arroz chorando covardemente ao saberem que estão "prometidos" por bandidos saqueadores.Indo consultar o velho sábio ancião da aldeia,a dica dada é que alguns deles viajem até a cidade para conseguir convencer samurais para defende-los em troca apenas de comida.É aí que começa a primeira parte do filme,a do recrutamento,onde eles se deparam com o grande mestre samurai Kambei(sensacional Takashi Shimura).Junto com Katsushiro um jovem pretendente à samurai que implora para ser discípulo de Kambei,eles recrutam:Gorobei,o esperto;Heihachi,o medíocre mas bem-humorado;Shichiroji,velho amigo fiel de Kambei;e Kyuzo,um mestre da espada de humor introspecivo.
Contra a vontade de todos,eles são seguidos pelo farsante despirocado Kikuchiyo(Toshiro Mifune).
Chegando no vilarejo,numa série de treinamentos e uma brilhante estratégia territorial eles vão se assimilando ao povo enquanto se conhecem cada vez mais em meio à brigas,sucessos,desacordos,revelações...na batalha final na chuva,a família está formada,e a constante luta contra a sobrevivência se torna uma massa única.
Buscando o máximo de realismo,Kurosawa não poupa o brilhante roteiro de toda a habilidade possível para colocar a câmera à disposição do desenrolar da aventura.Com planos perfeitos,closes viscerais de uma mise-en-scene em que a troca de energia climática entre os atores dentro uma edição de closes suados embalados por uma trilha hipnótica viria a influenciar Leones e Copollas.A câmera entre cavalos,flechas se movimentando em travellings perigosos,extraindo toda a emoção da cena.O uso de slow motion para filma a morte,o costume olhar da lente para o sol por entre as folhas da árvore em meio à flores onde o o jovem Katsushiro tem seu encontro com Shino,a linda jovem forçada por seu pai a se vestir de menino para,ironicamente,fugir dos olhos dos samurais.
No meio dessa variedade rica de acontecimentos e personas,os opostos estão toda hora se enfrentando;o velho e o novo,o experiente contra o inexperiente,o mestre soturno Kyuzo contra o palhaço Kikuchiyo.O bonito é que toda a fervilhação desses opostos acabam se unindo frente ao perigo,sendo reunião tão díspare de heróis sendo imitado por westerns de Sturges,"Canhões de Navarone",etc.,mas sem nunca atingir tanta profundidade emocional com cada um dos envolvidos na trama(nem "Branca de Neve e os Sete Anões"de 1937).
Duas atuações são absolutamente icônicas: Toshiro Mifune e Takashi Shimura,dois dos atores mais inacreditáveis que a sétima arte concebeu.
Mifune feroz e animalesco,mas longe do assassino de "Rashomon",ele tem momentos sublimes que revelam um personagem inconvenientemente esparrento,mas com amor necessário para ter o senso de amizade que a situação proporciona.Quando ele toca o alarme para enganar os camponeses assustados no inicio do filme, ou na sublime confissão em que é revelado o seu passado como camponês.Mas é no momento em que,com um bebê no colo depois de ver a morte da mãe deste,ele chora desesperadamente estático,com o velho moinho pegando fogo ao fundo, gritando as recordações da situação à qual ele já tinha presenciado;até que o destino final o coloca como o cara que se mostra o mais valoroso de todos,pois não tinha nascido seguindo uma regra samurai,apenas o seu coração.
Shimura por sua vez exala sabedoria ,coçando a cabeça raspada (como faria Yoda anos depois),com seus olhos mais uma vez passando muito mais que monólogos.E esse era o diferencial seu com o primeiro.Mifune grita,esbraveja,ruge suas frases,compondo um personagem de uma forma tão única e verdadeira que nenhum ator jamais faria posteriormente...Shimura só olha e diz tudo com o olhar.
"Os Sete Samurais" foi o primeiro filme exclusivamente de samurai do Kurosawa,e continua ainda como uma das grandes aventuras do cinema,um thriller sem o qual não existiriam os thrillers,uma análise profunda sobre os valores dos próprios samurais(mercenários egoístas em sua maioria ou inativos diante da pólvora),e um dos exemplos mais comoventes de amizade.
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