sexta-feira, 21 de setembro de 2012

"Viagens Alucinantes"(1980) - Ken Russell



"Viagens Alucinantes" é um daqueles filmes que devem ser vistos em tela grande.Um dos espetáculos visuais mais impressionantes,letárgicos e psicodélicos do cinema.Só que há um porém.Aprecia mais quem já teve sob influência de drogas psicoativas.Não adianta dizer que não...é uma realidade.Ken Russel foi um dos grandes diretores a colocar o psicodélico em imagens cinematográficas,como em "Tommy",que se baseia no álbum conceitual do The Who,clássico do rock pós-67.Suas cinebiografias sobre compositores guardam uma ligação de estados alterados com a música.E não é só isso,ele tinha uma conceitualização artística em seus filmes que davam uma liberdade à câmera e aos personagens em narrativas de uma pungência áudio-visual incrível.

Baseado nos experimentos do cientista John C. Lillys, o filme conta a busca obssessiva do professor de psicologia Jessup(William Hurt em seu debut)pelo estado puro da consciência humana,na tentativa de provar o quanto os estados alterados da  mente podem constituir uma realidade tão verdadeira quanto o nosso estado normal,trancado em tanques de isolamento.Ele decide viajar para o México para fazer uma experiência tribal com Ahayuasca(uma erva alucinógena) e após sofrer uma viagem única de estado alterado de consciência,ele volta com a droga para os EUA e começa a fazer testes sobre o efeito dela nos tais tanques,até que progressivamente a sua genética humana vai regredindo ao homem-primata em direção à um estado de proto-consciência,de origem da vida.Baseado num livro de Paddy Chayefsky,o premiado roteirista de "Marty"(1955),seus personagens agem alienadamente em diálogos bem construídos que vagueiam pelos delírios místicos de Jessup e explicações científicas-filosóficas sobre sua busca e como sua obsessão pelo trabalho prejudica a sua humanidade e família.

As cenas surreais editadas poeticamente dos delírios de Jessup são de uma lindeza impressionante com um trabalho de edição de som magnífico e a trilha sonora de John Corigliano indo de forma angustiante do horror ao fantástico.E é aí que entra um facto:de que o filme é melhor compreendido sobre drogas psicoativas.Somente quem já atingiu o estado alterado da consciência uma vez na vida vai se sentir como Jessup,que não presta atenção ao seu amigo Manson,respeitado médico que nega as causas da experiência por causa de um suposto perigo.Todos os medos de infância de Jessup e sua negação de Deus após a morte do pai se fundem com sexo,demônios e fogo numa montanha russa de imagens sonoras.Junto com "Medo e Delírio" de Terry Gilliam,esse é um dos poucos filmes que conseguem retratar em arte cinematográfica o delírio extra-sensorial das drogas.A cena em que Jessup vira matéria cósmica e é resgatado heróicamente por sua mulher é de um poder tão impressionante quanto as idéias que Douglas Trumbull deu para Kubrick retratar o portal de estrelas de Júpiter em "2001",uma óbvia inspiração.De deixar de boca seca.