domingo, 9 de outubro de 2011

"La Strada"

Quando Fellini filmava "I Vitelloni",o roteirista Tulio Pinelli voltou em uma viagem que ele fez pelas montanhas, pela falta de auto-estrada que ligasse Roma à Turin.
Disse ter visto um homem com problemas mecânicos numa estranha "carruagem" e uma pequena mulher a empurrando.Quando retornou contou a Fellini o sucedido e disse que a historia àrdua desses dois seria um otimo argumento pra seu proximo filme.Seria o ideal para uma tematica/estilo neo-realista  do qual Fellini ainda era adepto;uma viagem,um road-movie com a Italia de background.
Porem Fellni teve aquilo que os deuses chamam de inpiração da alma e resolveu transformar eses dois personagens em Zampano e Gelsomina.
Zampano(inspirado por um açougueiro de Rimini,da infancia do diretor,que apesar de brutamontes levava todas as mulheres pra cama)é um monstro que carrega consigo um espetaculo itinerante em que ele arrebenta correntes com o peito.
Gelsomina,um dos personagens mais complexos de todos os tempos.Uma das vitimas  da pobreza do pós guerra,sequelada pela fome,vendida pela mãe para Zampano por 10.000 liras,vivendo num mundo proprio,mundo esse que sera violentado e corrompido por Zampano.
A partir dai seremos brindados pelas atuações magistrais de Giulietta Masina(que vai do amor ao odio com um movimento dos olhos,não os olhos de qualquer um,mas de alguem da inocente complexidade de Gelsomina) e de Anthony Quinn,um violoncelo carnal de paixão e violencia.
A mente fraca,timida,inocente e ludica de Gelsomina sofrerá a violencia moral e física de Zampano.Gelsomina será o seu cachorro.Quando aprende à base de varadas a ser sua assistente e descobrir o prazer de se viver em entreter um publico,é arremedada com imprecações.Quando o sexo pode se tornar um elo de ligação entre os dois,ela descobre que Zampano despudoradamente leva outras mulheres para a cama,relegando ela a segundo plano.Nessa sucessão de desventuras e aprendizados da louca Gelsomina,Fellini mistura o realismo e vulgaridade das mulheres,das ruas,da multidão e de Zampano(como se a Italia fosse ela toda um caldo de desespero e vulgaridade)com a esperança de amor que personagem de Masina por si só ja representa.O real negativo,o sonho como salvação e o amor lutando para surgir entre os dois.
Quando Gelsomina foge de Zampano e percorre o centro da cidade sozinha,ela é mostrada do ponto de vista de quem não pertence ao mudo dela e de Zampano.Quantos de nós não nos colocamos no lugar daqueles jovens que a bulinaram chamando-a de louca e se assustaram com o estranho Zampano chegando para recolhe-la com insolitas ameaças e imprecações.Como esses jovens,percebemos que estamos presenciando o retrato de duas personas unicas.Nunca conheceriamos a vida de alguem como Gelsomina e Zampano se não vivendo no mundo deles;ou num filme.

Richard Basehart é outro ator que merece menção honrosa com sua interpretação de "Il Matto",um personagem cigano que representa a loucura da alienação referente tanto à realidade quanto à arte.Ao contrario de Gelsomina ele conhece a realidade,e por isso usa do anarquismo para "combate-la",atormentando Zampano com sucessivas sacanagens que acabam resultando na tragedia conclusiva.

Por fim Fellini não se contenta em contar uma ótima e original historia,mas seu estilo,sua camera,sua edição,seus atores e Nino Rota(principalmente com o pungente e importante tema "Travelling Down a Lonely Road"tocado por Gelsomina no trompete)tornam concretos os sentimentos,desejos e decepções desses personagens,nos tornando testemunhas de algo que pertence aos nossos sonhos pela consciência coletiva
e transformando o melodrama em fruto do real visto pelos olhos do magico.
A cena em que Zampano percebe que a solidão foi resultado de sua propia ignorancia e desprezo pelo amor que ele sempre teve capacidade de sentir mas sempre renegou;os olhos de Quinn mostrando a unica brecha de fragilidade do personagem,vale a revisão do filme como obra absolutamente sensitiva.

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